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Posts Tagged ‘estações’

ela

é a única estação de género feminino, precedida pelo deprimido inverno e à qual sucede o verão moreno e depilado. poderá ter-lhe sido concedido o género pelo seu perfume fresco e sensual. mas, é no seu temperamento inconstante que mais se assemelha à tendência feminina. entre as noites suaves e doces e o frio lancinante. entre as tardes soalheiras e as águas tardias e implacáveis. é o fim do tédio e o nascimento do desejo e do prazer; dos dedos cravados na pele e dos corpos quentes entrelaçados na madrugada.

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as flores do mal

Por detrás dos muros do Palácio, há uma rua com jacarandás. Os jacarandás anunciam, agora, a chegada da Primavera tal como sempre a conhecemos. O sol aquece o dia, ainda alto, e o calor que se faz sentir é rápido. Ainda assim, hoje senti o primeiro cheiro da Primavera. Regressou alguma passarada e estão, também, de volta as roupas ligeiras. Ao meu lado, ele lamentava as perdas irreparáveis no seu olival e na vinha – consequências da falta de chuva. Também os carros ficarão imundos por causa dos jacarandás e os danos serão irreparáveis se sobre eles não cair um peso de água. Sim, é verdade: aí está a Primavera. Mas, isso não é necessariamente bom.

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a dança

Era a noite mais longa de todas as noites e a rua brilhava com a chuva. Ouviam-se botas a bater na calçada e as pernas mexiam-se num compasso rigoroso. Por toda a cidade um movimento harmoniozo que aceita o inverno e devolve a humildade da dança. Dura como pedra, a canção entoava, então, como se todos a estivessem a ouvir.

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golpe baixo

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dead combro

Não me apercebi do tamanho do frio até ela passar por mim com a face rosada e a pele branca quase a desaparecer por entre o cachecol verde e a boina castanha. Era um frio muito grande. Enfiei as mãos nos bolsos do casaco enquanto voltava a olhar e sorri, porque convém sempre sorrir com as dádivas da invernia. Desci e, de repente, um nevoeiro cerrava toda a colina da frente como se fosse ali decretada a morte da calçada, o fim derradeiro da vertiginosa rua que outrora se estendera até S.Bento. Nunca antes assistira a tal coisa – uma Lisboa londrina para sempre.

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tempo e espaço

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galego do sul

Esta cidade tem demasiado sol. Por isso, quando nasce Outubro, gostava de ter nascido lá onde as serras se erguem em tonalidades outonais, as mulheres têm os olhos verdes e o peito quente, e onde as tardes são como cobertores. Home is where the heart is, dizem. E no Outono eu gosto do Minho.

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canções de setembro

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Sento-me na varanda a aguardar o Outono. Os dias a diminuir, a brisa a gelar a pele, as vozes a desaparecerem no bairro, as janelas fechadas e nem um som das televisões. Setembro é como um crepúsculo que se perpetua, um eterno final ou um velho cobertor que aconchega o sossego e devolve a civilidade ao corpo.

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heat

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A tarde aquece na vereda. Do lado direito um casal discute, não se percebe bem o quê, em câmara lenta. Volto a olhar diabolicamente. Uma árvore corta o caminho. A vereda aquece e com ela a tarde e a discussão. Sejam amigos. Assim não. Se o Verão traz os cheiros mais propícios a todo o amor, também traz as zangas nas veredas a meio da tarde, o clima de insegurança e desencontro. Sejam amigos. As veredas não foram feitas para isso.

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Quando eu era pequeno, e pequeno nos termos do adorável a vários títulos, havia um globo lá por casa que brilhava com uma luz que orientava o olhar a norte e colocava a Terra numa posição quase absoluta. Pensar a Terra como um globo era um exercício e não uma percepção – um dogma civilizacional ou até work in progress. Nada que fizesse alguém, em tão tenra idade, questionar essa verdade insofismável. Era pequeno, apenas pequeno. Os anos trouxeram o resto do Universo, tal como o quotidiano e a poesia; a ciência e o empirismo; a guerra e a paz. Hoje, ao caminhar em bossa nova pelo passeio fatalista da minha rua, vi a Terra ovalar o quarteirão da escola e figurar-se redonda num globo de mar em que as nuvens assumiam a espuma, e a lua, quase longe, fazia o papel da pequena luz marcando uma presença consoladora. Já junto do tosco canteiro suburbano, as flores emanaram um perfume singelo e fresco em guerra breve contra o meu olfacto enfumarado e, à falta de descrição imediata, fiz-me um pequeno Galileu em frente da imensidão.

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as flores do mal

o maior problema deste início de primavera é o total estado de inebriação a que somos sujeitos. são os cheiros que o vento traz ou que os corpos mantém, é a claridade e a cor da pele. a primavera é matreira como o lobo. disfarça-se com flores para nos matar com os espinhos da lamechice. há que resistir e tentar ver as coisas com clareza.

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ruptura

aproxima-se a primavera em avalon. a cidade abre-se agora na diversidade e clarifica-se no seu liberalismo endógeno. casa por casa. homem por homem. o rio corre devagar e as margens brilham ainda que timidamente. o tempo estende-se nas cordas de roupa das vielas e passam outras mulheres com o sorriso que nasce como amendoeiras em flor. é a explosão das ruas, o cheiro do corpo, o elogio das tardes longas. e assim, devagar e baixinho, podemos dizer com assertividade: you can never hold back spring

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jano e o deserto

janeiro sempre foi um mês deserto. e tal como o deserto, janeiro é profícuo em criar ansiedade. longo, lento, seco e com um horizonte que parece não se alterar com o nascer dos dias. o mês que se plantou na minha janela trouxe de novo o melro preto, mas poucas mais novidades. só silêncio e inquietação. só agora compreendo o carnaval.

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These are the seasons of emotion and like the winds they rise and fall
This is the wonder of devotion – I seek the torch we all must hold.
This is the mystery of the quotient – Upon us all a little rain must fall…It’s just a little rain…

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pequeno lamento optimista

toca a campainha do forno e levo o prato para a mesa onde o pouso com o vagar de mais uma sexta-feira a jantar sozinho. os olhos perdem-se pela mesa e resignados encontram a garrafa, o copo, a sombra do candeeiro e uma nódoa na toalha gasta e cansada de tantas sextas-feiras vazias. no gira-discos roda o song book de gershwin na voz veludosa de fitzgerald. é então que me sinto empurrado e precipito-me pela escada até à rua onde os carros parecem celebrar, os casais deslizam inundados de todo o amor, as crianças brincam sob o brilho directo das estrelas, a lua nasce a correr e uma secção de metais sai detrás de um camião. a bateria tropical ritma um grupo de bailarinos de rua e até francis scott parece sorrir largando o bourbon. um imenso calor de dezembro e meia dúzia de gotas de água pálida descem pelo meu corpo que agora se expande alegremente pelo passeio na tranquilidade de uma caminhada voyeurista. a voz de fitzgerald – é ela que me acorda, então, a meio do banho. limpo as gotas e o calor vai-se desfazendo até enfiar a camisola. saio para jantar acompanhado e talvez tudo possa acontecer.

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linger it longer

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vila do conde 1

as antigas terras da maia partiam da ponte da pedra até à póvoa do varzim. eram longos terrenos agrícolas que nada deviam aos feudos. os agricultores mais velhos eram homens pujantes e resistentes ao tempo que passa. mas, chegados ao mar, a realidade era outra. homens com o cabelo branco, gastos e cansados cujos olhos eram uma mistura de amargura e ternura. terra de gente simples mas com uma personalidade forte e bastante desconfiada. berço de poesia revoltosa e literatura serena. exílio burguês. vila do conde, hoje dominada pelos negócios duvidosos e por fortunas da mesma natureza, é, como todas as cidades à beira mar, uma marginal de esperança e de morte.

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